domingo, 15 de junho de 2014

Coleccionar pessoas


A mais singular das colecções é também a mais económica.
Sempre que alguém me chama a atenção, abro uma ficha biográfica e integro-a no meu catálogo. Inventariei centenas de espécimes como qualquer coleccionador, principiei por recolher os tipos mais comuns: o burlão, a esposa entediada ou o intelectual narcisista. Mas como sucede com todos os que têm uma colecção, o meu gosto foi-se tornando mais selecto. Obtidos os cromos essenciais, comecei a sonhar com raridades. Apaixonei-me pela originalidade.
Passei horas a travar conhecimento com pessoas,a provoca-las, num esforço permanente, por vezes mal interpretado, outras vezes desperdiçado. E assim conquistei peças exóticas, mesmo únicas. Como um militar com ideais comunistas e uma louca perversa com ideais de vitima á espera de ser canonizada.
Gosto de ficar a observá-los, como soldadinhos de chumbo com vida de diferentes exércitos e de interagir com eles. Um prazer solitário, diga-se, mas esse é um traço comum a muitos coleccionadores.De tanto procurar a originalidade ficou a faltar-me aquele artigo banal. A criatura que nos recorda alguém sem grande exactidão, aquela pessoa que achamos sempre que conhecemos mas de cujo nome nunca nos lembramos, vou procura-la nas filas do supermercado, na loja de roupa, na sala de espera do dentista...... existe por ai mas não me lembro onde.